VE
c

JULINHA


          Vou contar uma outra estória, que tem início nos meus tempos do Grupo Escolar Presidente Roosevelt, em Passa Quatro-MG.  Foi lá pelos idos e bons tempos dos anos de 1958, 1959.  Eu me lembro, "tudo está ainda diante dos meus olhos"...  Eu tinha 9 anos de idade, e estava no terceiro ano do curso primário.  Na minha sala de aula, muitos alunos e alunas, nessa mesma faixa etária.




          Na hora do recreio, meninos não se misturavam com meninas.  Haviam pátios separados.  Mas, todos os dias, ao final da aula, os alunos deixavam o Grupo Escolar, e saiam caminhando pela rua, para suas casas.  As crianças iam sozinhas.  Nenhum pai ou irmão tinha carro nessa época para levar as crianças.  E a caminhada de volta para casa, era tranquila.  Igualmente, as Professoras também iam a pé de volta para suas casas, era tudo muito natural.
          Era comum também, ver uma Professora rodeada de crianças, principalmente meninas, caminhando juntas num cortejo até gracioso, em direção às suas respectivas casas.  Na minha sala, ou na minha turma, também acontecia o mesmo.  E eu, às vezes, me juntava a esse cortejo, e seguia junto com as meninas e a Professora, nessa caminhada de volta para casa, mas no meu caso, era por um motivo especial: nesse grupo de alunos e alunas acompanhando a Professora, havia uma menina, que eu achava muito, mas muito bonitinha...Ela se chamava Julia, e todos a chamavam de "Julinha".  Eu só olhava para ela admirando-a, mas parece que ela nem me notava. Era apenas uma admiração, eu achava que a Julinha era a mais bonitinha da Escola. Éramos todos crianças, e namoro, nunca passou pela minha cabeça nessa idade.  Eu só olhava, nada mais.  Que menina bonita, a Julinha.  A mais bonita da Escola.

          Mas o tempo passa, implacavelmente, e nossas vidas tomam rumos diferentes.  Agora, estamos no ano 2001, e eu, há muito tempo, deixei para trás a vida tranquila e bucólica de Passa Quatro.   Mas, o destino me trouxe neste ano, duas surpresas; uma triste e outra alegre, assim simultaneamente, e no mesmo dia.  Vou contar como aconteceu, foi assim:

          Meu tio Carlos, já havia falecido a algum tempo, e agora, a sua mulher, de nome Zafiriça Papadoplo (ou popularmente Paparuna, como era conhecida), coitada, morreu.  Ela já vinha sofrendo com problemas de saúde.  Bem, é a vida.  Deus assim determinou. 

          Eu saí de Resende, onde agora tenho minha residência, para ir ao seu enterro, lá em Passa Quatro.  Mas, eu me atrasei um pouco na viagem, e quando lá cheguei, ela já se encontrava dentro de um caixão, na Igreja Matriz da cidade, e a missa de corpo presente já havia começado.

          Mesmo assim, encontrei um lugar próximo ao altar, e pude assistir à sua missa.  Terminada a missa solene, fui acompanhando a movimentação das pessoas presentes, e quase na porta de saída da igreja, fui abordado por uma mulher, que me chamou pelo nome, e assim me falou: - Guilherme! Como vai?  Eu sou a Adelaide, fui sua professora, lembra?

          Confesso que ela me surpreendeu, e levei alguns segundos para me situar e lembrar; - Ah, sim, Dª Adelaide? Nossa, que surpresa, que saudade...  Ela ainda me disse o seguinte:  - Lá em casa, ainda guardo os trabalhos que você fez para o jornalzinho da escola, lembra?  Bem, eu não me lembrava com detalhes desse tal jornalzinho, mas disfarcei e disse: - sim, Dª Adelaide, há quanto tempo, ainda tem guardado esses trabalhos escolares? 

          Nesse momento, uma outra mulher que estava junto com a Dª Adelaide, interrompeu e disse: - E de mim, você se lembra? - Confesso que também não me lembrava assim de momento, mas acho que ela percebeu a minha dúvida, e logo tratou de falar: - Eu sou a Beatriz Galvão, freguesa da sua tia... Quando ela disse o seu nome, imediatamente me lembrei: Ela era aquela moça que se casou um dia, em Passa Quatro, e para quem a minha tia fez um vestido de noiva, muito bonito, todo trabalhado.  Essa Beatriz, era filha do casal Nair Galvão e Francisco Galvão Cesar, conhecido como Chiquinho Galvão, e que na época, era o Prefeito da cidade!

          Então eu disse para ela: - Sim, eu me lembro de você, e guardo também fotos antigas do seu pai.  Conversamos mais alguns minutos e nos despedimos, porque eu devia acompanhar o cortejo fúnebre, que já seguia em frente.  Depois, quando eu já estava ao lado do meu carro, estacionado bem próximo da Igreja, fui novamente abordado:

          - Guilherminho?  Eu sou a Julinha, sua colega de escola! - Confesso que dessa vez a surpresa foi maior ainda, e assim meio desconcertado, disfarcei o espanto e conversei com ela poucos minutos, sem saber direito  o que falar.  Ela estava mudada, uma moça bonita, um pouco diferente daquela Julinha da minha escola primária.  Ela me disse: - apareça por aqui de vez em quando, você sumiu de Passa Quatro...  -  Eu disse que sim, que apareceria sim, mas no fundo, eu sabia que não poderia cumprir a promessa... 

          Bem, foi assim, nos despedimos, e eu continuei surpreso, interiormente.  Puxa, três pessoas, três surpresas agradáveis no mesmo dia, e simultâneas, apesar do motivo para o qual eu ali me encontrava, ou seja, para um sepultamento...

          Isso me deixou pensativo por vários dias, mas por fim, conclui meus pensamentos com um veredicto rápido em duas palavras: MILAGRES ACONTECEM! (E parece que o mundo fica mais bonito quando boas coisas acontecem)... ...

Julinha

Nenhum comentário:

Postar um comentário

FALO POR MIM